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Entrevista da Semana Segunda-feira, 11 de Fevereiro de 2019, 08:35 - A | A

11 de Fevereiro de 2019, 08h:35 - A | A

Entrevista da Semana / DEVER CUMPRIDO

“Deixo o MP com seis prêmios nacionais e equilibrado do ponto de vista financeiro, em um período talvez mais difícil que o órgão atravessou na história recente”, diz Curvo

Ele volta a atuar, a partir de 1º de março, na promotoria de Várzea Grande junto ao Tribunal do Júri e apoia as mudanças proposta pelo atual ministro da Justiça

Antonielle Costa e Lucielly Melo



Prestes a deixar o comando do Ministério Público do Estado, o promotor de justiça, Mauro Curvo, falou com o Ponto a Curva sobre sua gestão e seus projetos futuros.

Para ele, os dois anos que esteve à frente do comando da instituição foram os mais difíceis da história, diante da crise econômica e financeira que enfrenta tanto Mato Grosso quanto o Brasil.

Foram diversos atrasos no repasse do orçamento que, segundo ele, exigiu muita habilidade da sua equipe para fazer mais com menos. Algumas ações deixaram de serem feitas, mas houveram avanços, destacados na entrevista, que levaram inclusive o MP do Estado a ser um dos mais premiados em dois anos -- foram seis prêmios nacionais ao todo.

Curvo lamentou sua não reeleição, mas não pelo poder, e sim, porque queria dar continuidade ao projeto de implantação de um sistema de inteligência artificial para prevenir a corrupção.

Ele volta a atuar, a partir de 1º de março, na promotoria de Várzea Grande junto ao Tribunal do Júri e apoia as mudanças proposta pelo atual ministro da Justiça, Sérgio Moro, principalmente a que prevê a prisão e o início do cumprimento da pena logo após a condenação nos crimes de competência do júri.

Veja abaixo a íntegra da entrevista:

Ponto na Curva: Em sua primeira entrevista ao Ponto na Curva, logo após a posse, o senhor disse que iria trabalhar dois pilares, um da saúde e outro de combate à corrupção. Nesses dois anos de gestão, o que foi feito de forma efetiva nessas áreas?

Mauro Curvo: Na área da saúde, uma das principais iniciativas foi a constituição do consórcio intermunicipal, para que os municípios de Mato Grosso possam adquirir medicamentos da farmácia básica em conjunto, que iniciou no dia 6 de março de 2018. Temos dentro dele cerca de 70 municípios, ou seja, mais de dois terços da população, só não conseguimos fazer com que ele funcionasse. Existe lei estadual que prevê a sua constituição, leis municipais em todos os municípios que aderiram ao consórcio, mas não funciona por falta de recursos financeiros. É preciso dinheiro em caixa para a mão de obra necessária, visando a elaboração de uma ata de registro de preços de medicamentos, que possa ser adquirida pelos municípios consorciados. Precisa-se ainda contratar farmacêutico, pregoeiro, bacharel em Direito, um diretor executivo, um sistema e isso requer dinheiro. E, infelizmente, os municípios consorciados não têm condições de fazer o aporte necessário para começar a funcionar e o Estado de Mato Grosso também não tem. Buscamos formas alternativas e por meio de uma parceria com a Assembleia Legislativa, esta fará um repasse de R$ 900 mil ao consórcio. Um colega que trabalha em Várzea Grande fez um acordo dentro da promotoria dele, que gerou R$ 900 mil também. Então, quando o consórcio receber esse dinheiro, ele pode começar a funcionar. Quando isso acontecer, com certeza vamos conseguir uma grande economia na aquisição desses medicamentos, pois serão comprados em maior quantidade e quem vender para o consórcio vai ter certeza do recebimento, já que os municípios vão ter uma conta corrente individual, onde vão colocar, por exemplo, R$ 200 mil e adquirir qualquer remédio que foi licitado até o limite de R$ 200 mil. 

Ainda na área da saúde, conseguimos ajudar os hospitais filantrópicos, fazendo destinação de recursos oriundos do combate à corrupção. Por exemplo, em relação ao Hospital de Câncer, conseguimos a aquisição de um equipamento mais moderno do país para fazer radioterapia, que deve chegar daqui um mês. Foi adquirido por uma pessoa que participou de desvio de dinheiro público e que foi feito um acordo de que a multa civil de dano moral coletivo é para a compra do equipamento. Em outro acordo, conseguimos o repasse mensal de alguns milhares mensais, durante 12 meses, para comprar remédio quimioterápico também para o Hospital de Câncer que, com isso, se organizará para pagar outras dívidas. Do mesmo modo, conseguimos ajudar a Santa Casa, destinamos dinheiro para a construção do Centro de Reabilitação Dom Aquino Corrêa – foi um valor maior, coisa de R$ 14 milhões, salvo engano –, para o Hemocentro e ajudamos na reforma do Hospital Regional de Peixoto de Azevedo, tudo por meio de ações civis. Conseguimos ainda que os hospitais filantrópicos passassem a ter recursos do Fundo Estadual de Estabilização Fiscal, estamos falando em R$ 600 mil por mês para cada um, que enfrentam situações dificílimas, mas que estariam mais difíceis se não tivesse esse recurso. 

Acredito que não basta ser eficiente na recuperação de dinheiro desviado, tem que prevenir o desvio. Prevenir é muito mais importante para a sociedade do que ser eficiente na recuperação

Na área do combate à corrupção, conseguimos em dois anos, de dezembro de 2016 a dezembro de 2018, recuperar aproximadamente R$ 2 bilhões, seja por meio do CIRA ou das promotorias que atuam na área. Não só conseguimos esses recursos como também avançamos internamente numa tentativa, a princípio, que foi vista em uma apresentação no Conselho Nacional do Ministério Público como a mais inovadora e importante do Ministério Público Brasileiro, de montar em Mato Grosso uma inteligência artificial preventiva, que prevenisse o desvio de dinheiro público. A caminhada é longa e em dois anos não conseguimos. Mas, licitamos a Microsoft para fazer a operação em nuvem e ter o poder computacional necessário, fazer esses cruzamentos de dados, porque se tivéssemos que comprar hardware não conseguiríamos ter dinheiro suficiente. Somos o primeiro Ministério Público a operar 100% em nuvem do país, isso nos permitiu, por exemplo, instalar aqui em Mato Grosso o teletrabalho. Temos pessoas que contratamos, são assessores que ficam aqui na Promotoria de Cuiabá e daqui trabalham para colegas do interior. Por operar em nuvem, a distância não é mais uma parte muito importante na equação e da solução dos problemas. Ainda nessa caminhada para montar a inteligência artificial preventiva, conseguimos montar um centro operacional às promotorias que trabalham com cruzamento de dados, que é o CAOP CSI. Conseguimos estruturar o CAOP CSI e firmar parceria com o Tribunal de Contas. Temos a base de dados do Aplic e outras ferramentas que melhoraram nossa atuação, mas os frutos disso serão colhidos mais para frente. Ainda não trouxe grandes impactos hoje, mas com certeza trará nos próximos tempos. Esperamos que o doutor José Antônio Borges, que assume no dia 1º de março, dê continuidade a esse trabalho, para podermos atuar e entregar a sociedade aquilo que ela espera de nós. Acredito que não basta ser eficiente na recuperação de dinheiro desviado, tem que prevenir o desvio. Prevenir é muito mais importante para a sociedade do que ser eficiente na recuperação.

Ponto na Curva: Os acordos têm tido mais efeitos na prática do que as ações judiciais?

Mauro Curvo: Isso. Antigamente, éramos muito demandistas, entrava com uma ação e ia discutir o resto da vida. Hoje, as coisas de certa forma mudaram com uma série de fatores. Um deles é essa certeza da prisão após a condenação de segundo grau, que leva as pessoas que participaram de desvios a tentarem fazer acordo para evitar essa prisão. Daí se consegue nos acordos recuperar dinheiro que foi desviado.

Ponto na Curva: O senhor não acredita que isso gera impunidade?

Mauro Curvo: Não, a devolução é a parte mais visível do acordo, mas ele também prevê que a pessoa vai cumprir uma pena e existem outras punições. No mundo, onde se vê a justiça funcionar de forma célere é porque ela não julga mais do que 10 a 20% dos casos, o restante é resolvido com acordo. Nos Estados Unidos vemos isso com clareza. A esmagadora maioria dos crimes são objetos de acordo, onde se impõe uma pena independentemente de processo. O que ocorre nos Estados Unidos que retroalimenta esse sistema? Aqueles que não querem fazer acordo e que vão à julgamento, se eles são absolvidos, parabéns para eles, mas se são condenados, as penas são extremamente rigorosas. Uma das propostas do ministro Sérgio Moro é até nesse sentido, de trazer esses acordos para mais crimes. O Conselho Nacional do Ministério Público já tem uma resolução que trata da não persecução penal, então aqui está caminhando vagarosamente para isso.

Ponto na Curva: Na época da posse como procurador-geral, o Grupo de Atenção Especial e Combate ao Crime Organizado (GAECO) estava em alta após dezenas de operações. A atuação foi um pouco tímida nesses dois anos, mesmo com um promotor a mais. O senhor coaduna com esse entendimento?

Mauro Curvo: Eles fizeram, talvez, menos operações, mas fizeram operações que dão mais trabalho pelo volume de pessoas envolvidas, pela complexidade, pela quantidade de informações que precisam ser analisadas. Por exemplo, a Operação da Rêmora, na Secretaria Estadual de Educação, ali levou-se o secretário de Educação e um empresário a fazerem delação. Então, veja, se houve essas delações foi por conta da qualidade da prova que foi apurada, porque ninguém que vê que não vai ser condenado faz delação. A delação só passa a ser alternativa quando ele vê que a condenação é certa, grande e rápida. E isso só é feito com base em provas e elementos de convicção que são trabalhados. A qualidade da operação, da complexidade, levou essas duas pessoas a fazerem delação, mas ainda não recebemos esses acordos para trabalharmos nos desdobramentos dele. Outra situação complexa foi a investigação da Bereré no Departamento Estadual de Trânsito, que teve duas fases. Olha quanta gente envolvida e com foro! Tudo é mais complexo! Nessas duas operações, tivemos a dedicação dos colegas, dos delegados e da PM para poderem desencadear essa operação, que é a fase mais visível de uma investigação. É quase que uma ponta de um iceberg: para baixo dele nada aparece, tem muito mais serviço do que o que apareceu na operação. Se faz uma operação numa manhã e muitas vezes as pessoas entendem que o trabalho se esgotou ali. Não, antes daquela manhã muitas, mas muitas horas de trabalho foram dedicadas e depois muitas a mais para analisar o material que se apreendeu. Muitas vezes é colhido terabyte de informações para poder processar. Além dessas duas, ainda houveram outras nove operações do Gaeco, mas cito essas duas por causa da complexidade e do tamanho delas. Na Bereré houve delação, a situação avançou bastante e ainda não acabou.

Ponto na Curva: Em 2017, havia um déficit de 19 promotores em todo o Estado. Esse quadro mudou?

Mauro Curvo: Não, não conseguimos fazer concurso e todos os aprovados do último foram empossados. A situação tende a se agravar com as aposentadorias que vem ocorrendo. Sendo assim, vai ter que se fazer concurso e dar posse na medida da possibilidade, porque a necessidade já existe e é grande.

Ponto na Curva: Nesses dois anos foram constantes os atrasos no repasse do duodécimo por parte do Executivo. Isso impactou na sua gestão e de que forma? 

Conseguimos motivar as pessoas dividindo com elas uma visão de futuro, que é ter uma instituição que consiga prevenir desvio de recursos públicos e impactar na vida da sociedade, para que as políticas públicas tenham mais recursos para atenderem quem mais precisa

Mauro Curvo: Isso aí, talvez, foi a maior dificuldade que enfrentamos. Para alguns analistas, talvez estamos a sair da maior crise econômica da histórica, outros falam que se não for a maior é uma das maiores. Administrar num período de escassez de recursos é muito complicado. Nesses momentos é preciso fazer mais com menos e nesse caminho escolhemos capacitar e motivar as pessoas e conseguimos, através do CEAF - Centro de Estudo de Aperfeiçoamento Funcional - montar uma plataforma de ensino a distância e conseguimos capacitar mais gente do que anteriormente se conseguia e mais barato, já que à distância não há necessidade de se deslocar. Conseguimos motivar as pessoas dividindo com elas uma visão de futuro, que é ter uma instituição que consiga prevenir desvio de recursos públicos e impactar na vida da sociedade, para que as políticas públicas tenham mais recursos para atenderem quem mais precisa. 

Ainda falando em vencer a dificuldade, investimos também em tecnologia, só que não conseguimos ter acesso rápido a tecnologia exatamente pela falta de recursos, o que exigiu que tivéssemos criatividade. Na questão da operação em nuvem, antes da Microsoft ganhar licitação, fui à São Paulo e visitei Microsoft, o Google, a Oregon e a Amazon, propondo para que vissem o MP de Mato Grosso como uma porta de entrada para o MP brasileiro e saí vendendo a ideia de operação em nuvem para outros colegas procuradores gerais. Na semana que foi dada a ordem de serviço, levei à Microsoft a sete outros procuradores gerais e a empresa já está atuando também dentro desses outros sete Ministérios Públicos, a operação em nuvem vai entrar nos 27 Ministérios Públicos, é questão de tempo. Então exigiu que fizéssemos esse trabalho: sensibilizar quem tem a tecnologia a investir conosco aqui, para que possamos ser a porta de entrada para outros Ministérios Públicos e isso tudo levou mais tempo. Não bastava sensibilizar a pessoa e falar assim: "quero contratar vocês, me dá o seu preço que vou pagar". Tinha que ser assim: "venham aqui que vou apresentar outras oportunidades para vocês". Essa construção demorou muito mais tempo do que se tivéssemos recurso, que teríamos com rapidez.

Coisas concretas deixaram de serem feitas, como a construção da Promotoria de Várzea Grande. Havia um planejamento de já estar pronta nessa altura do campeonato, mas nem começou a obra, porque vai levar cerca de R$ 18 milhões e como não tínhamos, precisávamos priorizar o essencial. Então ela ficou para trás. Agora, até para minha felicidade, há uns 20 dias, estive na Assembleia Legislativa com o presidente Eduardo Botelho e dizia que a população de Várzea Grande iria enfrentar uma situação complicada na questão do acesso à justiça porque o Fórum está sendo construído na região do Chapéu do Sol e nossa promotoria fica no centro da cidade. Imagina o várzea-grandense mais humilde que precisa ir na promotoria e depois ir ao fórum acompanhar o processo, o trabalho que iria ter. Conversando com o deputado, disse que se fosse possível, agora em 2019, a Assembleia conseguir mais recursos para serem destinados exclusivamente para a construção da Promotoria de Várzea Grande. Conversei com o doutor José Antônio e ele concordou com essa destinação e, posteriormente, na semana passada, o doutor José Antônio e Eduardo Botelho me disseram que a ideia tinha vingado e conseguido mais recursos no orçamento, em torno de R$ 16 milhões, para fazer a construção.

Ponto na Curva: Hoje qual o déficit do Executivo com o MP?

Mauro Curvo: De 2016 a 2017, temos R$ 2 milhões, que são objetos da Proposta de Emenda Constitucional (PEC) do Teto dos Gastos, que prevê que receberemos isso parcelado de acordo com o excesso de arrecadação. Em relação a 2018, em torno de R$ 20 milhões, vamos nos reunir com o secretário de Fazenda para ver como sera pago.

Ponto na Curva: Muito se ouve de que há dois grupos no MP, situação e oposição, que por sua vez teve um candidato que venceu a última eleição. Isso de fato existe? O que aconteceu, já que o senhor não conseguiu se reeleger?

Deixo o MP equilibrado, no ponto de vista orçamentário/financeiro, com comprometimento de 1,8% com pessoal na Lei de Responsabilidade Fiscal quando os demais estão estourados

Mauro Curvo: O doutor José Antônio, que ganhou a eleição, nunca foi minha oposição. Ele se aliou à oposição nessa eleição, houve uma soma de votos dele, mais os votos da oposição e ganharam. A oposição se juntou ao doutor José Antônio, que em termos políticas institucionais, com exceção a esta eleição que ganhou, ele esteve sempre literalmente do nosso lado. A oposição ganhou, ganhou o candidato que ela apoiou, mas até meia horas antes de haver essa união de forças ele não era da oposição. Isso é um fato histórico. Digo que não só somaram os votos do doutor José Antônio, que é uma pessoa respeitadíssima aqui na instituição, que já tinha sido três vezes de presidente da associação, estava na quinta candidatura a procurador-geral, mais os votos da oposição e também um sentimento de mudança que tomou conta do país e aqui não foi diferente. Saio perdendo uma eleição com 53% de votos, que normalmente a pessoa está eleita em primeiro turno. Tive esse percentual e perdi porque nossa eleição permite que o eleitor vote em até três pessoas, para montar a lista tríplice e encaminhar a lista para o governador. Houveram 20 colegas que votaram em nós dois e ambos passamos de 50%. Ele obteve 139 votos de 259 e eu tive 138. A nossa soma de votos é superior ao de eleitores.

Ponto na Curva: Ficou triste por não ter conseguido se reeleger? Foi uma surpresa?

Mauro Curvo: Queria ter sido reeleito, nada de apego ao poder, mas para ter mais tempo de levar em frente esse projeto, que ao meu ver é importantíssimo, da inteligência artificial para prevenir o desvio de recursos públicos, essa era minha meta. Teríamos mais dois anos para entregar isso funcionando, num estágio mais avançado. A alternância de poder gera esse risco de não continuidade e a demora de retomar. Duas coisas que fico triste: a possibilidade de isso não ir mais para frente e deixar de conviver com pessoas que convivo aqui na Procuradoria Geral há 10 anos. Lia esses dias, o que para mim fez todo o sentido, um texto que falava que feliz é aquele que quando prossegue sua caminhada deixa pra trás as portas abertas e sai sem carregar em seu coração mágoas e ressentimento. É exatamente meu caso. Saio da Procuradoria deixando aqui amigos, tenho certeza que deixo as portas abertas e saio sem qualquer tipo de mágoa ou ressentimento, só gratidão. Fui eleito dois anos atrás, com 140 votos. Dois anos depois, passadas grandes turbulências, principalmente econômica, que o país e Mato Grosso atravessaram, conseguimos ter 138 votos e 53% de aprovação de nossa gestão, num período talvez mais difícil que o Ministério Público já atravessou na história recente. Isso me dá a certeza do dever cumprido. E as manifestações de carinho, de apreço e de reconhecimento, acho até que vai além do que mereço pelo trabalho efetuado, que venho tendo todos os dias. E mais: saio com 53% de votos de aprovação e deixando o Ministério Público como um dos mais ou o mais premiado nesse biênio. Foram seis prêmios nacionais e não me lembro de outro Estado ter conseguido isso em dois anos. Deixo o MP equilibrado, no ponto de vista orçamentário/financeiro, com comprometimento de 1,8% com pessoal na Lei de Responsabilidade Fiscal quando os demais estão estourados. "Ah esse 1,8% atrapalhou", mas se tivéssemos feito um caminho de não zelar pelo recurso público, de fazer mais com menos, se não fosse essa filosofia, talvez estivéssemos feito um concurso e dado posse para mais seis pessoas e com isso ganhado a eleição, mas não compensa, porque abandonaria aquilo que acredito, os princípios, que não se podem abandonar. Nosso princípio foi sempre esse, falar a verdade, mostrar o que dava e o que não dava para ser feito e não fazer nenhum tipo de promessa que sabe que não vai entregar e de procurar fazer mais com menos. O resultado disso foram seis prêmios nacionais, equilíbrio financeiro num cenário de altíssimas dificuldades e minhas contas aprovadas em 2017 pelo Tribunal de Contas, sem ter um único apontamento, com a conselheira relatora escrevendo no voto que a gestão era exemplar para qualquer outro gestor de recursos públicos.

Ponto na Curva: O senhor deixa a procuradoria e volta para a promotoria com atuação junto ao Tribunal do Júri. Recentemente, o ministro da justiça tem proposto algumas mudanças, que vão impactar no Código Penal, Código de Processo Penal e na Lei de Crimes Hediondos. Como vê esses projetos?

Foi condenado, o quê mais pode se pensar em presunção de inocência quando sete pessoas do povo analisam e por maioria entendem que ele cometeu o crime? Não tem presunção de inocência que pode macular um veredito desse. Então vamos executar o veredito, foi condenado, foi apenado então vamos cumprir a pena

Mauro Curvo: O que vi foi pela impressa. Estamos em processo de transição e toda hora faz-se reunião com a equipe que vai assumir, sem contar as obrigações que temos. Não tive como analisar detalhadamente, mas tudo aquilo que li pela imprensa, penso que as reformas estão no caminho certo, não tenho dúvida disso.

Ponto na Curva: Uma das propostas vai impactar diretamente na atuação do senhor junto ao Tribunal do Júri, que é o inicio do cumprimento da condenação logo após o veredito. Coaduna com esse entendimento?

Mauro Curvo: É a melhor de tudo, a previsão legal da prisão depois do julgamento pelo júri. Isso é fundamental. Uma das coisas que muito me incomodava quando fazia júri, era que muitas vezes o réu respondia solto, ele era condenado, saía pela mesma porta e a ia pegar o mesmo ônibus que a família da vítima ou da testemunha. Brincava que nessa situação, qualquer pessoa enxergava naquele réu a impunidade ambulante e olha que ele tinha acabado de ser condenado. Não tem explicação a pessoa ser condenada por um tribunal de júri, por um crime doloso contra a vida e não ir preso. Foi condenado, o quê mais pode se pensar em presunção de inocência quando sete pessoas do povo analisam e por maioria entendem que ele cometeu o crime? Não tem presunção de inocência que pode macular um veredito desse. Então vamos executar o veredito, foi condenado, foi apenado então vamos cumprir a pena.

Ponto na Curva. Isso não viola o princípio do duplo grau de jurisdição?

Mauro Curvo: Não, pois no duplo grau de jurisdição, o tribunal não pode reformar a decisão e absolver, no máximo que ele pode é mandar fazer um novo júri. Se o máximo que o segundo grau pode fazer é mandar um novo júri, então se executa a pena e leva ele para o segundo júri preso, cumprindo a pena. O Tribunal do Júri tem uma particularidade, porque pelo princípio da soberania dos vereditos não se pode pegar alguém que foi absolvido e condená-lo e não pode pegar alguém que foi condenado e absolvê-lo. Então executa a pena. Se o tribunal entende que não tem prova, ele foi condenado, mas a princípio não está muito correto, manda para um novo júri, mas que ele aguarde preso respeitando o princípio da soberania dos vereditos, que é previsto constitucionalmente.