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Opinião Terça-feira, 23 de Outubro de 2018, 09:21 - A | A

23 de Outubro de 2018, 09h:21 - A | A

Opinião /

O "Dízimo tributário" sobre os benefícios fiscais

É abusiva a forma de instituição do FEEF pelo Estado, aliado ao grave desrespeito à confiança depositada ao mesmo pelo contribuinte

Daniele Fukui Rebouças



O Estado de Mato Grosso em junho deste ano criou o Fundo Estadual de Equilíbrio Fiscal – FEEF e estabeleceu condições para gozo de incentivos fiscais ou financeiros relacionados ao ICMS. O Fundo foi instituído pela Lei nº 10.709/2018 e regulamentado pelo Decreto Estadual nº 1.563/2018.

De acordo com a Lei estadual o Fundo foi criado com o objetivo de destinar recursos para implementação e a execução de políticas públicas de saúde e ao auxílio na recomposição das finanças públicas estaduais, a fim de promover o equilíbrio fiscal.

Neste contexto a obrigação de pagamento do FEEF é imputada aos contribuintes do Imposto sobre Operações relativas à Circulação de Mercadorias e sobre Prestação de Serviços de Transporte Interestadual e Intermunicipal de Comunicação – ICMS, neste Estado, como contrapartida para fruição de incentivos e benefícios fiscais, financeiros-fiscais ou financeiros, que resultem em redução do ICMS a ser pago.

Importante destacar que o Estado de Mato Grosso impôs a obrigação do pagamento do Fundo Estadual de Equilíbrio Fiscal exatamente na época em que se tratava da possível convalidação dos benefícios fiscais concedidos pelo Estado em desacordo com a Constituição, assim, pairava a insegurança jurídica sobre os benefícios fiscais, o que preocupava o contribuinte que poderia ter a qualquer momento seu benefício retirado, e ainda a possibilidade do Fisco Estadual cobrar o respectivo passivo tributário.

Assim, o Convênio ICMS 190/2017, na forma da Lei Complementar 160/2017, previa uma espécie de perdão dos impostos recolhidos com base nas leis estaduais que criaram benefícios fiscais sem observar as regras da Constituição e com a possibilidade de confirmar estes benefícios. Neste cenário os Estados poderiam conceder remissão, anistia e reinstituir os benefícios tratados nesse convênio, desde que atendidas as seguintes condicionantes:

I) os Estados tinham que publicar, em seus respectivos diários oficiais, relação com a identificação de todos os atos normativos, relativos aos benefícios fiscais, instituídos por legislação estadual ou distrital publicada até 8 de agosto de 2017, em desacordo com a CF/88;

II) efetuar o registro e o depósito, no CONFAZ, da documentação comprobatória correspondente aos atos concessivos dos benefícios fiscais.

Logo, foi neste contexto que surgiu este “dízimo tributário” sobre os benefícios fiscais, ficando estabelecido um percentual para cada seguimento, dos quais se destacam alguns: a) Frigoríficos - estabelecimentos mato-grossenses que promoverem saídas internas de carnes e miudezas comestíveis das espécies bovina, bufalina, suína e de aves, frescas, refrigeradas ou congeladas, percentual de 3,5% (três e meio por cento) do valor da respectiva operação; b) setor atacadista e varejista de material de construção, percentual de 2% (dois por cento); c) setor atacadista e distribuidor de gêneros alimentícios, percentual que varia entre 0,70% a 1,20%; d) PRODEIC.

Assim, não restou alternativa a estes contribuintes, senão realizar o pagamento do FEEF, sob pena de perder seu benefício.

Contudo, apesar do esforço do Estado verifica-se que a Lei que criou o Fundo Estadual de Estabilização Fiscal é inconstitucional, vez que extrapolou as competências constitucionais da União e a reservada a Lei Complementar (art. 146 da CF); deixou de observar o princípio da não-surpresa fiscal (art. 150, III, “b” e “c” da CF); além de não respeitar a segurança jurídica (proteção da confiança) aos estabelecimentos que realizaram investimentos, e eventuais outras contrapartidas como condição para gozo dos benefícios fiscais concedidos por prazo certo.

Em resumo é abusiva a forma de instituição do FEEF pelo Estado, aliado ao grave desrespeito à confiança depositada ao mesmo pelo contribuinte. E como consequência da medida instituidora do FEEF dentro do contexto relatado destaca-se a insegurança jurídica do contribuinte (quebra de confiança) e o desestímulo aos novos empreendimentos, o que pode ser ainda mais prejudicial ao Estado. Assim a alternativa que resta ao contribuinte insatisfeito é questionar judicialmente tanto a criação, como a cobrança deste novo tributo.

Daniele Fukui Rebouças é Advogada especialista em Direito Tributário pelo Instituto Brasileiro de Direito Tributário (IBET). Pós-graduanda em Direito Processual Civil pela Universidade Federal do Estado de Mato Grosso – UFMT. Atual membro da comissão de Estudos Tributários e Defesa do Contribuinte da OAB/MT. Membro da Associação Brasileira de Contribuintes (ABCONT). Membro suplente do Conselho de Contribuintes do Estado de Mato Grosso – SEFAZ/MT (biênio 2018 a 2020).