Lucielly Melo
Após o Supremo Tribunal Federal (STF) reconhecer a competência da Justiça Eleitoral para julgar crimes comuns que estejam relacionados a delitos eleitorais, a defesa do servidor público, Valter Sampaio, pediu a anulação da sentença que condenou ele e outras 11 pessoas pelo esquema de superfaturamento de R$ 44 milhões na gestão de Blairo Maggi, caso que ficou conhecido como o “Escândalo dos Maquinários”.
Para embasar a petição encaminhada ao Juízo da Sétima Vara Criminal de Cuiabá, a defesa, que é patrocinada pelos advogados Valber Melo e Filipe Maia Broeto, citou que o esquema teria sido usado para pagar despesas de campanha de políticos em 2010, configurando, dessa forma, o crime de “caixa 2”, e, por isso, deve ser cancelado o recebimento da denúncia, bem como a condenação, e levar o caso para julgamento na Justiça Eleitoral.
“Assim se argumenta para dizer que, na esteira do posicionamento firmado pelo SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL, compete à Justiça Eleitoral processar e julgar os crimes eleitorais, bem como aqueles que lhes forem conexos, pouco importando a capitulação jurídica que lhes é dada na denúncia”, pontuaram.
Conforme explicado pelos advogados, por mais que o Ministério Público não narrou a ocorrência do crime eleitoral na denúncia, a suposta prática do delito ficou comprovada no decorrer da instrução da ação penal, portanto, a competência da Justiça Comum “se esfacela, devendo o caso ser remetido à Justiça Eleitoral”.
“Destarte, não é possível valer-se o “Parquet” de vias hermenêuticas para, ao narrar um crime de “caixa 02”, subsumir a conduta dos acusados a tipos penais comuns, com a possível finalidade de burlar a competência da Justiça Eleitoral”, frisaram.
Nos casos em que se verifica que a corrupção, por exemplo, teve por finalidades angariar fundos para favorecer determinando político ou grupo político, ainda que inexista tipificação específica sobre “crime eleitoral” na peça acusativa, deve a incompetência do juízo comum ser declarada
“Por assim ser, nos casos em que se verifica que a corrupção, por exemplo, teve por finalidades angariar fundos para favorecer determinando político ou grupo político, ainda que inexista tipificação específica sobre “crime eleitoral” na peça acusativa, deve a incompetência do juízo comum ser declarada”, completaram.
No documento, eles negaram a ocorrência de qualquer crime cometido pelo servidor público, mas que os fatos frisados pelo delator Pérsio Briante, de que as empresas pagaram propina aos políticos, “é indesmentível que o retorno nada mais era do que a prática do “caixa 02”, não mencionado pelo Ministério Público do Estado de Mato Grosso de forma expressa na denúncia”.
Para os defensores, mesmo diante dos indícios da prática de crime eleitoral, o Ministério Público teria deixado de se manifestar da eventual incompetência da Sétima Vara Criminal para julgar o caso.
“Mesmo encerrada a instrução e ficando evidenciado que os supostos esquemas tiveram como finalidade a arrecadação de fundos para a campanha de 2010, o Ministério Público ficou silente, e o juízo passou a decidir, ocasião em que, mais uma vez, fica inequívoca a descrição – EM RELAÇÃO AO REQUERENTE, INEXISTENTE, POIS SEQUER É CITADO PELO DELATOR – da ocorrência de hipotéticos crimes eleitorais”.
Anulação de sentença
Eles citaram, ainda, entendimento do ministro Marco Aurélio, de que as sentenças podem ser anuladas após a nova jurisprudência do STF quanto à competência da Justiça Eleitoral.
“Destarte, levando-se em consideração a descrição fática contida na denúncia, assim como a fundamentação lançada na sentença, tem-se que inegavelmente os fatos em apreço versaram sobre possíveis crimes eleitorais, razão pela qual o processo entelado, por tramitar perante juízo absolutamente incompetente, é totalmente nulo, ante a violação de dispositivos Constitucionais e infraconstitucionais, nos moldes da fundamentação até aqui exposta, amparada em recentíssimo e incontestável posicionamento da Suprema Corte”, concluíram.
A condenação
O servidor público, Valter Sampaio, pegou 12 anos e seis meses de prisão e 2 anos e 8 meses de detenção, que devem ser cumpridos em regime fechado. Ele ainda deverá pagar 206 dias-multa, cada uma no valor de 50% do salário mínimo.
Já o ex-secretário de Administração, Geraldo Aparecido de Vitto Junior, foi sentenciado a 2 anos e 8 meses, 20 dias de detenção, em regime aberto e 80 dias de multa, também no valor de 50% do salário mínimo. Ao aplicar a sentença, o juiz Marcos Faleiros decidiu substituir a pena privativa de liberdade por duas restritivas de direito, sendo elas a prestação de serviço à comunidade e prestação pecuniária.
Os empresários Ricardo Lemes Fontes, José Renato Nucci, Valmir Gonçalves de Amorim e Marcelo Fontes Correa Meyer terão que cumprir 5 anos de reclusão, em regime semiaberto. Todos devem também pagar 50 dias em multa, no valor de 50% do salário mínimo.
Acusados de participarem do esquema, os também empresários Otávio Conselvan, Sílvio Scalabrin, Rui Denardim, Harry Klein Rodnei Vicente Macedo e Davi Mondin pegaram 5 anos de reclusão e mais 2 anos e 4 meses de detenção, pena imposta para ser cumprida no semiaberto. Eles devem quitar, ainda, 120 dias em multa, estabelecidas, cada uma, no valor de 50% da remuneração mínima.
Entenda mais sobre o caso
O caso começou a ser investigado após o então governador Blairo Maggi receber, em fevereiro de 2010, uma denúncia de suposto superfaturamento na aquisição dos maquinários. Na época, ele solicitou que a Auditoria Geral do Estado apurasse os fatos. Logo depois, a auditoria apontou um rombo de R$ 44 milhões.
No relatório final, ficou comprovado que R$ 20,585 milhões estão relacionados a sobrepreço na compra dos maquinários e que R$ 23,899 milhões foram superfaturados, somente na compra dos 376 caminhões basculantes.
O caso foi parar no Ministério Público Estadual e a promotora Ana Cristina Bardusco, relatou a ocorrência, em tese, de crimes de fraude à licitação e peculato, por parte dos responsáveis pelos pregões, que são realizados pela Secretaria de Administração.
Diante dos fatos, Bardusco solicitou à Delegacia Fazendária a abertura de inquérito policial para investigar as denúncias. Há ações cíveis e criminais que tramitam na Justiça Estadual e Federal.
Nesse caso, o empresário Pérsio Briante, da Extra Caminhões, firmou um acordo de colaboração premiada dando detalhes dos fatos. Mas, o MPE requereu a rescisão do termo, após detectar não cumprimento do mesmo.
Contudo, o juiz Marcos Faleiros entendeu que não houve quebra da delação e rejeitou a ação contra o colaborador.