Há dezoito anos surgia no país a Lei n 11.340/2006, Lei Maria da Penha. A norma trouxe em seu bojo o instrumento de proteção que tem garantido a integridade física e a vida de muitas mulheres: a medida protetiva de urgência.
Com o decorrer de estudos e a aplicabilidade da Lei Maria da Penha, foi possível observar que as medidas protetivas foram pensadas pelas legisladoras e legisladores como um aparato à disposição das mulheres. São as mulheres as detentoras desse pedido. Assim, enquanto elas disserem que dela necessitam, há necessidade de que continue em vigor, válidas.
Por óbvio, muitos entendimentos começaram a surgir com o advento da Lei Maria da Penha, pois se perfazia no “desconhecido”, e com nuances um pouco diferente das demais normas. Primordialmente, ao eclodir o acontecimento da violência doméstica, é de um crime que estamos tratando. Delitos demandam lavratura de boletim de ocorrências e investigação. Todavia, não somente isso, por se cuidar de âmbito doméstico e familiar, onde as relações de afeto se desdobram. Outras demandas, não somente as criminais, são necessárias para que as mulheres possam “sair”, de fato, da violência doméstica. Comuns são após a lavratura dos boletins de ocorrência: ações de divórcio, dissoluções de união, guarda de filhos e filhas, alimentos, partilha, e por aí afora.
Ademais, pelas medidas protetivas estarem à disposição das mulheres em situação de violência doméstica, também podem ser requeridas independentemente da lavratura de boletim de ocorrências, através de pedido autônomo. Aliás, as medidas protetivas possuem o caráter de autonomia, sendo, ainda, híbridas, já que a mulher pode dela se valer para pedidos cíveis e/ou criminais.
Esse extraordinário instrumento processual foi e tem sido motivo de discussões acaloradas e entendimentos diversos perante o sistema de justiça. Teria prazo? Desde o advento da Lei Maria da Penha, nunca houve a estimativa de prazo, já que as ameaças não possuem prazo de validade. Todavia, possivelmente por política judiciária, convencionou-se a validade de 6 meses, com o questionamento da mulher em situação de violência quanto à necessidade da renovação pelo mesmo tempo, e assim sucessivamente.
Conversando com muitas mulheres que vinham passando pela violência, e fazendo o uso processual das medidas protetivas de urgência, não conseguiam sentir segurança com o lapso temporal. Temiam que a qualquer momento as medidas fossem extintas, e elas ficassem desguarnecidas, mais ou menos como quem ostenta uma “Espada de Dâmocles”.
Apesar da mudança legislativa da Lei Maria da Penha, no ano de 2.023, ter afirmado textualmente que as medidas protetivas não deveriam ter prazo de validade, entendimentos ainda calhavam pelo respectivo prazo.
No último dia 13, o Superior Tribunal de Justiça decidiu pelo prazo de validade indeterminado para as medidas protetivas, devendo serem mantidas pelo período que a vítima estiver sob risco. O relator, Ministro Rogério Schietti, asseverou que a revogação do instrumento processual pode representar um feminicídio, citando pesquisa realizada pelo Ministério Público de São Paulo: “Em 97% dos casos de violência contra a mulher em que houve a concessão de medidas protetivas, evitou-se o feminicídio. A conclusão da pesquisa foi a de que o feminicídio é uma morte evitável”.
A Lei Maria da Penha é regida pela proteção integral à mulher, dada a condição de vulnerabilidade histórica, com a interpretação sempre a prestigiar a igualdade de gênero. Michelle Obama foi enfática: “Qualquer homem que use a força para oprimir as mulheres é um covarde, e ele está atrasando o progresso de sua família e seu país.”
Rosana Leite Antunes de Barros é defensora pública estadual e mestra em Sociologia pela UFMT.