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Penal Quarta-feira, 01 de Junho de 2022, 07:38 - A | A

01 de Junho de 2022, 07h:38 - A | A

Penal / REVISÃO CRIMINAL

TJ anula sentença transitada em julgado por falta de prova que afastasse a presunção de inocência

A tese foi aplicada pelo colegiado, que decidiu pela absolvição do ex-vereador Wanderley Cerqueira após concluir que as provas produzidas em ação penal não foram capazes de comprovar o crime de falsidade ideológica

Lucielly Melo



A ausência de standard de provas, que seja capaz de afastar a presunção de inocência, justifica a nulidade de sentença já transitada em julgado, causando a absolvição do réu.

A tese é da Turma de Câmaras Criminais Reunidas do Tribunal de Justiça de Mato Grosso (TJMT), que julgou procedente uma revisão criminal e absolveu o ex-presidente da Câmara de Várzea Grande, Wanderley Cerqueira, do crime de falsidade ideológica.

“Se as provas produzidas na ação penal de origem não autorizavam, dentro de um juízo de valoração racional, a condenação – por se revelarem débeis na demonstração da culpabilidade do réu, acima de qualquer dúvida razoável –, há espaço à revisão criminal por não cumprimento do standard de provas capaz de enervar a presunção de inocência, justificando a absolvição do réu”, diz trecho do acórdão.

Wanderley foi condenado a dois anos e quatro meses de reclusão, em regime aberto, por nomear, em 2009, Benedito Carmindo das Chagas como assistente parlamentar da vereadora Isabela Cristina Penedo de Freitas Guimarães. Porém, o servidor acabou desempenhando a função de vigilante. Ele também foi acusado de, na condição de 1ª secretário da Câmara Municipal ter designado Benedito como auxiliar de gabinete, mesmo tendo ciência de que o servidor continuaria a exercer a função de vigilante, em 2012.

A sentença foi proferida pela 4ª Vara Criminal de Várzea Grande e mantida pela Segunda Câmara Criminal do TJMT.

Entretanto, a defesa, patrocinada pelos advogados Valber Melo e Fernando Faria, protocolou a revisão criminal, apontando novas provas de que o ex-vereador não tinha conhecimento do desvio de função do servidor.

A condenação foi anulada pelo colegiado, nos termos do voto do desembargador Orlando Perri.

Standard de provas

Ao longo de seu voto, Perri destacou a importância do standard de provas, que, segundo ele, deveria ser usado pela justiça brasileira para decidir pela condenação ou não do réu.

“Essa visão estrábica decorre de nosso sistema processual, que nunca trabalhou a condenação sob a perspectiva dos standards de provas, porque sempre estivemos mergulhados no equivocado entendimento de que a livre convicção, quando assentada em provas com colores de “verossímil e minimamente consentânea com as evidências produzidas durante a instrução criminal”, torna a sentença condenatória imutável”.

Segundo o magistrado, se as provas da acusação não se sobrepõem às da defesa, em grau suficiente para afastar a presunção da inocência, “não há outro caminho senão a absolvição, pois o que pode existir é um estado de dúvida, seja em relação à existência do crime, seja em relação à autoria ou participação do réu nele”.

“Em tal situação, se se condenou quando cabia absolver com base na parêmia in dubio pro reo, há erro judiciário a ser reparado pela ação revisional. Para se chegar à conclusão acima, deve o Tribunal analisar se ao juiz – diante do complexo de provas – cabia duvidar e não duvidou; se, diante da dúvida, condenou, violou-se a presunção de inocência, em sua vertente in dubio pro reo”.

Conjunto-probatório frágil

Perri frisou que para caracterizar o crime de falsidade ideológica é necessário que o agente tenha previa ciência de que o futuro servidor iria desempenhar função diversa daquela seria nomeado – o que não ocorreu no caso, já que as provas produzidas na ação penal não foram suficientes para provas o dolo por parte do ex-vereador.

“Apesar do fragilíssimo conjunto probatório, tanto o juízo de origem quanto esta Corte de Justiça condenaram-no por ter assinado os termos de nomeação/readequação do cargo de Benedito Chagas, sem qualquer indicativo de dolo em sua conduta, pressupondo a ciência de um fato que prova nenhuma corroborou nos autos, não no standard exigido para a condenação”, completou.

“Nesse quadro, entendo que – desde a ação penal de origem – não existiam elementos judiciais para condenar o revisionando pelo crime de falsidade ideológica. Desse modo, as provas produzidas na ação original não estavam mesmo a autorizar a condenação do réu, porque militava, em seu favor, no mínimo, o favor da dúvida. Quando o Tribunal ignora a existência de dúvidas razoáveis e lança a condenação, a presunção de inocência é esfolada e abre ensanchas à revisão criminal”, concluiu o desembargador.

VEJA ABAIXO O ACÓRDÃO NA ÍNTEGRA:

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