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Cível Quarta-feira, 02 de Março de 2022, 14:38 - A | A

02 de Março de 2022, 14h:38 - A | A

Cível / PACOTE ANTICRIME

Aras defende uso de videoconferência em audiências de custódia

O assunto é alvo de uma ADI, que também questionou a proibição de instalação de dispositivos de gravação ambiental noturna em lugares considerados “casa” para fins penais

Da Redação



O procurador-geral da República, Augusto Aras, requereu que o Supremo Tribunal Federal (STF) altere o trecho do Pacote Anticrime (Lei 13.964/2019), que proíbe o uso de videoconferência em audiências de custódia.

O assunto é alvo de uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) proposta pela Associação Nacional dos Membros do Ministério Público (Conamp), que também questionou a proibição de instalação de dispositivos de gravação ambiental noturna em lugares considerados “casa” para fins penais.

As regras introduzidas pela lei questionada no Código de Processo Penal e na Lei 9.296/1996 contrariam jurisprudência da Suprema Corte, conforme pontuou procurador-geral.

Em relação à vedação do uso do instrumento de videoconferência em audiências de custódia, Aras defendeu a declaração de inconstitucionalidade. Por lei, essas audiências devem ser realizadas em até 24 horas após a prisão, contando com a presença do juiz, de representantes do Ministério Público e da defesa do preso.

Para ele, a possibilidade de utilização da videoconferência atende à urgência da situação processual e promove a prestação jurisdicional efetiva. Conforme a manifestação, a audiência de custódia é uma oportunidade para que o preso possa falar diretamente com a autoridade judicial, antes mesmo do interrogatório, ato processual que pode levar meses.

No parecer se esclarece que o objetivo não é reconhecer a videoconferência como regra para as audiências de custódia, mas impedir o engessamento da gestão administrativa e financeira do Poder Judiciário e do Ministério Público, em descompasso com os artigos 99 e 127 da CF.

Além disso, Augusto Aras alegou violação do princípio da proporcionalidade diante dos efeitos práticos da proibição absoluta, uma vez que o uso da tecnologia pode viabilizar o respeito ao prazo de 24h, em situações excepcionais e justificadas, quando presente uma das hipóteses do artigo 185, § 2º, do Código de Processo Penal. O documento citou dados do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), segundo os quais, entre 2015 e 2021, foram realizadas 679,6 mil audiências de custódia no Brasil.

O procurador-geral recordou que a vedação absoluta de videoconferências para audiências de custódia é incompatível com o devido processo legal, conforme acentuou o ministro Nunes Marques na decisão cautelar da ADI 6.841/DF. A manifestação do MPF também destacou que a autorização legal para a utilização de videoconferência em interrogatório de pessoa presa está prevista no artigo 185, § 2º, do CPP, em situações excepcionais e justificáveis, e sua constitucionalidade foi reconhecida pelo Supremo Tribunal Federal.

Captação ambiental em casa

Em relação à captação ambiental e inviolabilidade de domicílio, o parecer é pela procedência da ADI 6.919/DF apenas em relação ao trecho que trata da interpretação que impede a ponderação no caso concreto, por parte do julgador. A Lei 13.964/2019 criminalizou tanto a captação ambiental/vigilância eletrônica sem autorização judicial quanto a devassa ilegal do sigilo relacionado à medida. Também estabeleceu procedimento próprio para a captação ambiental/vigilância eletrônica, previu a possibilidade de aplicação subsidiária das regras aplicáveis à interceptação telefônica e telemática e deixou expresso que “não há crime se a captação é realizada por um dos interlocutores”.

O procurador explicou que a consignação textual da casa como asilo inviolável não pode inviabilizar a obtenção de provas essenciais à apuração de fatos criminosos graves. Por isso, Aras opinou pela declaração de inconstitucionalidade de toda a parte final do § 2º do art. 8º-A da Lei 9.296/1996, frisando que a finalidade da captação ambiental é permitir a apuração de condutas graves em que a relativização da inviolabilidade domiciliar, da intimidade e do sigilo das comunicações é o único meio eficaz para elucidação fática, cabendo ao magistrado proceder à fundamentação que ampare a utilização de meio especial de produção de prova.

Gravação ambiental para uso da defesa

A Conamp também questionou a expressão "em matéria de defesa" (parágrafo 4º do artigo 8º-A da Lei 9.296/1996) na redação dada pela Lei 13.964/2019, por entender que o texto viola o devido processo legal. O dispositivo em análise foi objeto de veto presidencial, posteriormente derrubado pelo Congresso Nacional.

O posicionamento recebeu parecer favorável da PGR, para quem o emprego da captação ambiental, realizada por um dos interlocutores, tanto em matéria de defesa quanto com vistas à elucidação criminosa por parte da acusação, promove o interesse público e a persecução penal, desde que comprovada a justa causa e a higidez do material.

De acordo com o parecer do procurador, ao julgar o RE 583.937 QO (Tema 237 da repercussão geral), o STF decidiu pela validade da prova produzida por meio de gravação ambiental realizada por um dos interlocutores, sem o conhecimento do outro. Aras também citou o Recurso Extraordinário 583.937, com repercussão geral, no qual o Supremo reconheceu ser lícita a prova resultante desse tipo de gravação por entender que “quem revela conversa da qual foi partícipe, como emissor ou receptor, não intercepta, apenas dispõe do que também é seu e, portanto, não subtrai, como se fora terceiro, o sigilo à comunicação”.

Para ilustrar a importância da captação ambiental realizada por um dos interlocutores, o parecer traz exemplos de crimes que ocorrem às escondidas, como estupro, maus-tratos a idosos, violência doméstica e familiar contra a mulher. Delitos que dificilmente podem ser esclarecidos por técnicas comuns de investigação – oitiva de testemunhas oculares, gravação por câmeras de segurança, busca e apreensão.

Nesse sentido, explicou Aras, invalidar gravações ambientais ou desprezá-las quando verificada integridade das provas, apenas por serem usadas pela acusação e não pela defesa, é incompatível com o princípio da igualdade, inviabiliza a paridade de armas no contexto do processo penal e tem o potencial de gerar a impunidade de ofensores cuja resposta estatal é imperiosa. (Com informações da Assessoria da PGR)