Da Redação
O Ministério Público Federal (MPF-MT) cobrou da Fundação Nacional do Índio (Funai) e do Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e Recursos Naturais Renováveis (Ibama) explicações sobre a Instrução Normativa nº 01/2021, que trata da exploração de terras indígenas.
A norma dispõe sobre os procedimentos a serem adotados durante o processo de licenciamento ambiental de empreendimentos ou atividades localizados ou desenvolvidos no interior de terras indígenas cujo empreendedor sejam organizações indígenas. Mas, em seu primeiro artigo, o documento traz que as organizações poderão ter composições mistas índios e não índios, além de cooperativas ou diretamente via comunidade indígena.
Para o procurador da República, Ricardo Pael Ardenghi, mesmo que esteja previsto no parágrafo primeiro que a composição mista deverá ser majoritariamente de domínio indígena, a normativa vai contra o que é assegurado na Constituição Federal de 1988, que prevê, em seu artigo 231, parágrafos 2º e 4º, que as terras tradicionalmente ocupadas pelos índios destinam-se ao usufruto exclusivo deles, de forma permanente, sendo inalienáveis e indisponíveis para outros. Assim, somente os indígenas possuem o direito, imprescritível, de usufruir das riquezas do solo, dos rios e dos lagos existentes nessa área.
Além disso, a impossibilidade da instalação de empreendimentos no interior dessas terras com a participação de organizações de composição mista está prevista no artigo 18 do Estatuto do Índio (Lei nº 6001/1973) e nos artigos 94 e 96 do Estatuto da Terra (Lei nº 4504/1964).
O artigo 18 do Estatuto do Índio traz que as terras indígenas não podem ser arrendadas ou objeto de qualquer negócio jurídico que restrinja o exercício da posse direta pela comunidade indígena. Já os artigos do Estatuto da Terra lembram que, apesar de estarem na posse dos indígenas, essas áreas são pertencentes à União, são de propriedade pública, e o contrato de arrendamento ou parceria na exploração dessas terras é vedado por lei.
TAC
Outro fato salientado pelo procurador é que, apesar de a instrução normativa ter sido elaborada em virtude do Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) nº 03/2019, firmado com o MPF, ela contraria pelo menos três cláusulas do acordo firmado.
O TAC firmado entre Ibama, Funai, indígenas e Ministério Público Federal, em 16 de dezembro de 2019, tem como objeto a regularização ambiental e fiscal das lavouras mecanizadas das comunidades indígenas Paresi, Manoki e Nambikwara, no interior das terras indígenas Rio Formoso, Paresi, Utiariti, Tirecatinga e Irantxe, no estado de Mato Grosso.
Nele foi acordado que as cooperativas indígenas devem assegurar a exploração da terra e o desenvolvimento de atividade econômica no interior do território demarcado exclusivamente por indígenas, não celebrando contratos que possam caracterizar arrendamento ou parceria, sob pena de rescisão do presente acordo.
Ainda segundo o TAC, compete à Funai realizar ações de fiscalização autonomamente ou em conjunto com o Ibama, orientando as cooperativas e associações indígenas, assim como seus associados, quanto à correta utilização das áreas a serem cultivadas e advertir seus membros quanto às consequências de eventual descumprimento do acordo.
Por fim, concluiu o procurador da República Ricardo Pael requisitando esclarecimentos também sobre a participação dos indígenas na elaboração do texto, já "que a referida Instrução Normativa Conjunta Funai/Ibama n. 1, de 22 de fevereiro de 2021, muito embora seja uma inegável medida administrativa suscetível de afetar os povos indígenas diretamente, não foi objeto de consulta prévia, livre e informada, como exige o art. 6º, 1, a, da Convenção n. 169 da OIT".
Funai e Ibama tem cinco dias para prestar os esclarecimentos requisitado. (Com informações da Assessoria do MPF-MT)