Da Redação
Para conter a propagação do novo coronavírus (Covid-19), o Poder Judiciário adotou o regime do teletrabalho, entre 20 de março e 20 de abril.
Em entrevista, o presidente do Tribunal de Justiça de Mato Grosso (TJMT), desembargador Carlos Alberto da Rocha, afirmou que, mesmo em casa, os magistrados e servidores não estão de férias, mas, que, na verdade, atendem normalmente a demanda jurisprudencial.
“Estamos trabalhando com praticamente 100% de nossa capacidade na modalidade de teletrabalho. Servidores, magistrados, terceirizados, todos conscientes de que não estamos de férias. Estamos sim, cumprindo nossas metas e nosso expediente, mas cada qual de sua casa, com o uso de diversas tecnologias, prestando nosso serviço à sociedade”.
Durante a entrevista, o presidente do TJ ainda citou a alta produtividade, o número de decisões proferidas pelos magistrados e, ainda, comentou a possibilidade de estender o teletrabalho para mais 30 dias.
LEIA ABAIXO A ENTREVISTA NA ÍNTEGRA:
Em tempos de pandemia pelo novo coronavírus, como o Poder Judiciário está trabalhando para continuar atendendo as demandas da sociedade?
Carlos Alberto: Estamos trabalhando com praticamente 100% de nossa capacidade na modalidade de teletrabalho. Servidores, magistrados, terceirizados, todos conscientes de que não estamos de férias. Estamos sim, cumprindo nossas metas e nosso expediente, mas cada qual de sua casa, com o uso de diversas tecnologias, prestando nosso serviço à sociedade.
Os sistemas do Tribunal de Justiça estão preparados para esta sobrecarga de trabalho remoto, com todos acessando ao mesmo tempo?
Carlos Alberto: Nos últimos anos, o Poder Judiciário de Mato Grosso vem se preparando para eliminar o uso de papel em processos administrativos e judiciais. E desde janeiro do ano passado começamos também a buscar nas esferas pública e privada, inclusive no primeiro mundo, quais as inovações que podem ser aplicadas na nossa área de atuação. Montamos um núcleo de inovações, criamos as audiências criminais por videoconferência, sem necessidade de tirar o reeducando do presídio. Lançamos aplicativo de celular que coloca praticamente todos os serviços do Judiciário nas mãos do cidadão, criamos plataforma para o juiz assinar documentos e sentenças usando seu celular. Foram muitas as inovações.
Trouxemos oficinas para servidores e magistrados nesta área de inovação e investimos muito em tecnologia da informação. E estamos avançando a passos largos. O Processo Judicial Eletrônico estará em 100% das comarcas e competências até o final deste ano, que totalizam 342 unidades.
A intenção é entregar à sociedade um Poder Judiciário preparado para atuar neste mundo totalmente conectado, que cada vez mais presta serviços de forma online, sem excesso de burocracia, com uma duração razoável. Estamos no caminho certo, porque, de repente, tivemos que nos recolher para combater o avanço do coronavírus. Muitas instituições brasileiras ficaram praticamente paradas, ou funcionando com capacidade mínima de execução. Mas o Poder Judiciário não parou, porque já estava preparado para agir rápido em situações de crise como esta. Em apenas dois dias, tivemos que desenvolver novas plataformas de trabalho online, organizar e distribuir tarefas, reorganizar equipes, criar novos fluxos de trabalho. E o resultado tem sido muito bom.
Como já estamos com o PJe em praticamente todas as comarcas, elas também já estão dotadas de infraestrutura e ferramentas capazes de suportar este trabalho em ambiente virtual, mesmo com a sobrecarga. A grande sobrecarga que o Poder Judiciário vem enfrentando atualmente é a utilização de VPN (sigla, em inglês, para Rede Virtual Privada). A VPN funciona como uma rede de comunicações entre computadores que têm acesso restrito a quem tem as credenciais necessárias. Ou seja, utilizada apenas pelos servidores e magistrados, principalmente para acessar arquivos em pastas locais, no servidor interno. A VPN também permite que estes servidores e magistrados trabalhem no sistema APOLO que é o sistema que gerencia os processos físicos. Tudo isso feito com muito controle da segurança da informação.
É natural que, em alguns momentos, há sobrecarga, devido ao uso maciço da VPN. Mas as respostas e soluções para estes problemas pontuais estão sendo muito satisfatórios pela nossa Coordenadoria de Tecnologia da Informação. Neste momento de esforço conjunto, agradeço a compreensão de todos, sociedade, advogados, promotores, defensores públicos. E digo, em nome dos nossos servidores e magistrados, que estamos fazendo o melhor que podemos.
O Tribunal de Justiça tem divulgado a boa produtividade de magistrados e servidores na modalidade de teletrabalho, resultados que foram elogiados pela advocacia e por diversos setores da sociedade. Esta produtividade será mantida?
Carlos Alberto: Sim, a produtividade de magistrados e servidores foi muito gratificante neste período. E na primeira semana de teletrabalho ainda havia a adaptação. Na segunda semana a produtividade foi melhor ainda. Ainda não divulgamos esses números, mas para se ter uma ideia, entre os dias 20 e 27 de março, os juízes totalizam quase 30 mil atos processuais, dos quais 7.858 foram de baixas definitivas, 10.002 foram sentenças, 1.031 acordos e 10.625 decisões. É uma produtividade muito, muito boa. E sim, faremos todos os esforços possíveis para manter uma boa produtividade na forma de trabalho virtual.
O senhor acha que esse será o futuro do Poder Judiciário?
Carlos Alberto: Sim, creio que esse será o futuro, não apenas para o Poder Judiciário, mas para muitas outras instituições brasileiras. No Judiciário esse futuro já é realidade, estamos preparados para essas inovações. Neste domingo (29 de março) o site Consultor Jurídico publicou um artigo de autoria do Secretário Nacional de Justiça no Ministério da Justiça e Segurança Pública, Vladimir Passos de Freitas. Ele conhece muito bem a estrutura do sistema judiciário brasileiro, é doutor em Direito, desembargador federal aposentado do TRF-4, foi presidente da International Association for Courts Administration (Iaca), da Associação dos Juízes Federais do Brasil (Ajufe) e do Instituto Brasileiro de Administração do Sistema Judiciário (Ibraju). Pois bem, o secretário nacional de Justiça descreveu como a pandemia do coronavírus está alterando a rotina dos órgãos do Poder Judiciário, destacou os bons resultados colhidos pelo Judiciário de Mato Grosso e fez esta mesma pergunta: como estará o Poder Judiciário depois desta pandemia?
Ao responder esta questão ele elencou diversas situações do chamado Judiciário do Futuro, que já estamos implantando aqui em Mato Grosso. Audiências por videoconferência, plenário virtual, plataforma para possibilitar acordos pré-processuais pelo PJe, sustentação oral de forma virtual, e até uma vara descentralizada virtual, que aqui em MT é a nossa vara da saúde, que atende pelo PJe todo o Estado. Lógico que a pandemia nos pegou de surpresa, assim como pegou o mundo todo. Mas como já estávamos na vanguarda das inovações, estamos conseguindo dar respostas rápidas e de forma eficiente aos anseios da sociedade.
A Presidência também tem atuado de forma intensa, inclusive na liberação dos alvarás. Como tem sido esse relacionamento com a advocacia mato-grossense?
Carlos Alberto: Sabemos que se trata de recurso essencial para a sobrevivência do advogado e de sua família, e que as partes também aguardam por esse recurso. Por isso a liberação de alvarás é uma de nossas prioridades. Em noves dias de teletrablaho, liberamos mais de 4.100 alvarás, que somados chegam a mais de 47,3 milhões de reais. Mas, além da análise, assinatura e liberação de alvarás, também estamos atuando diuturnamente na organização e administração do Poder Judiciário, agora de forma virtual. O fato de estarmos fisicamente separados não reduz nossa responsabilidade nem nossa carga de trabalho. É exatamente o contrário.
A portaria conjunta entre Presidência do TJ e a corregedoria determinou o teletrabalho por trinta dias, de 20 de março a 20 de abril. O senhor cogita ampliar esse prazo? Por quê?
Carlos Alberto: O Poder Judiciário de Mato Grosso vai se alinhar ao Conselho Nacional de Justiça que, na Resolução 313/2020, que estabeleceu regime de plantão extraordinário em todo o Judiciário brasileiro, até o dia 30 de abril, com o objetivo de prevenir o contágio pelo novo coronavírus e garantir o acesso à Justiça. Deste modo, inicialmente, pretendemos estender o teletrabalho no Judiciário de MT até essa data também.
Qual o percentual de unidades (varas, juizados) do Poder Judiciário de Mato Grosso que já trabalha com processos eletrônicos? E quantos processos físicos ainda existem?
Carlos Alberto: Hoje temos em torno de 886 mil processos em tramitação em Mato Grosso, dos quais pouco mais de 330 mil são físicos e aproximadamente 550 mil são eletrônicos. Estou considerando apenas o montante liquido, sem considerar os casos de suspensão ou sobrestamento do processo. O PJe já está implantado em 85% das unidades judiciárias. No começo deste ano avançamos bem na instalação do módulo criminal do PJe em comarcas de vara única, que já trabalhavam com o PJe cível, por isso a alteração no percentual não foi relevante. A partir de abril deste ano vamos melhorar esse percentual, com a instalação do PJE criminal nas comarcas de segunda entrância, onde funcionam exclusivamente de modo físico. Nestas comarcas existem três varas, normalmente duas cíveis e uma criminal.
Em quanto tempo vai deixar de existir processo físico em tramitação na Justiça de MT?
Carlos Alberto: Até o final deste ano queremos deixar 100% das comarcas de MT com o PJe implantado. Em diversas unidades estamos digitalizando os processos físicos existentes. Mas como não é um trabalho simples e nem barato, não faremos isso em todo o Estado. Desta forma, alguns processos físicos ainda vão tramitar até chegar ao fim, na forma física. Mas serão poucos, considerando o universo de processos em tramitação no estado de Mato Grosso.
Os processos administrativos no Judiciário de MT já tramitam por meio eletrônico. Muitos serviços já podem ser acessados por aplicativos, como o ClickJud. Se tudo ficar em meio eletrônico, é possível que em médio prazo o teletrabalho venha ser o modo padrão de prestar serviços públicos?
Carlos Alberto: Creio que algumas situações ainda vão exigir a presença do agente público, seja servidor, seja magistrado. Mas é fato que o teletrabalho vai ganhar um espaço muito maior. No Judiciário de Mato Grosso já estamos estudando inclusive métricas mais precisas para estabelecer as metas que cada um tem que cumprir no trabalho remoto.
Quais as lições que o senhor tirou desta pandemia, para o Poder Judiciário e para sua vida profissional como magistrado e administrador?
Carlos Alberto: Muitas lições. O Poder Judiciário, como já disse acima, sairá mais fortalecido, mais coeso e preparado para atuar em qualquer situação de crise. Também percebi que já estamos no futuro.
Em minha vida profissional, aprendi a extrair o melhor da equipe. Na iniciativa privada há uma máxima que diz que, quando contratamos alguém, contratamos suas qualidades e suas deficiências. Cabe ao líder estimular as qualidades e saber lidar com as deficiências do colaborador, para extrair dele o que há de melhor. Em situações de crise, quando tudo é para ontem, nem sempre com as condições ideais, essa tarefa se torna um grande desafio. Aprendi que os líderes do Poder Judiciário, magistrados e servidores que coordenam e dirigem equipes, estão preparados para estas situações.
(Com informações da Assessoria do TJMT)