Um homem expulso da aldeia indígena Cinta Larga, no norte de Mato Grosso, foi condenado por litigância de má-fé após tentar obter na Justiça do Trabalho o reconhecimento de vínculo empregatício com duas associações formada pelos indígenas que o acolheram por mais de 30 anos.
A decisão dada pelo juiz Adriano Romero, da Vara do Trabalho de Juína, concluiu que o autor da reclamação trabalhista, que viveu como membro da comunidade indígena desde 1988, distorceu os fatos para se vingar da expulsão da aldeia, motivada por denúncias de condutas impróprias, como assédio sexual a crianças indígenas.
Além de ter os pedidos rejeitados, ele foi condenado a pagar multa de 2% do valor da causa e honorários advocatícios.
Ao procurar a justiça, o autor afirmou que teria sido contratado inicialmente como motorista por um indígena e, mais tarde, pelas associações. Segundo ele, paralelamente à essa função, também fazia trabalhos de roçador e medidor de madeiras, mas que nunca teve a carteira assinada. Relatou que, por residir dentro da associação, era obrigado a estar disponível para atender a comunidade em tempo integral e, ao ser demitido, em 2023, não recebeu as verbas rescisórias. Ao final, pediu o reconhecimento do vínculo de emprego, o pagamento dos direitos trabalhistas e indenização por danos morais.
As associações indígenas argumentaram que o homem foi acolhido pela etnia como um de seus membros e passou a viver segundo os costumes da comunidade, sendo tratado como indígena e realizando atividades típicas da subsistência coletiva da aldeia. Além disso, afirmaram que as atividades eram compartilhadas e desempenhavam papel social e ritual na comunidade.
As entidades também apresentaram documentos da Funai e do Ministério Público Federal que relataram denúncias de assédio sexual envolvendo o autor. Esses fatos, segundo a defesa, explicariam a expulsão da aldeia, exclusivamente pelo comportamento criminoso, além de evidenciar que a ação trabalhista foi motivada por vingança pessoal.
Ao decidir o caso, o juiz Adriano Romero observou que o próprio autor declarou que teria trabalhado para um indígena em particular e não para as associações. Testemunha indicada pelo homem relatou que ele se identificava como motorista da Funai e nunca foi visto recebendo ordens diretas de ninguém, tampouco realizando atividades típicas de um contrato de trabalho formal.
O magistrado também destacou que o autor era registrado nos sistemas de saúde como indígena da etnia Cinta Larga, com prontuários médicos, cartão de vacinação e outros documentos que confirmavam a sua integração à comunidade. E que o próprio autor se apresentava como integrante da etnia, usufruindo dos programas da saúde indígena e vivendo em condições semelhantes às dos demais moradores da aldeia.
“Era consultado pelo Sistema de Saúde como se indígena fosse e ficava na aldeia para trabalhar como os demais indígenas faziam justamente, a ponto de dirigir eventualmente veículos, como outros indígenas faziam; limpar o quintal, como outros indígenas faziam”, descreveu o juiz.
Ao julgar improcedentes os pedidos, o magistrado ressaltou que outro entendimento violaria o modo de vida tradicional e coletivo da comunidade indígena, além de “macular a organização social, os costumes e as tradições do povo Cinta Larga, desconsiderando sua história e ancestralidade, asseguradas pela Constituição Federal”.
Má-fé
O juiz concluiu, por fim, que o autor distorceu os fatos e ajuizou a ação com finalidades impróprias, tanto financeiras quanto pessoais.
“O reclamante se valeu do processo judicial como instrumento de vingança, após ter sido expulso da aldeia devido à sua conduta inadequada”, enfatizou o magistrado.
O homem foi condenado a pagar multa de 2% do valor da causa às associações indígenas e a arcar com os honorários advocatícios.
A sentença ainda determinou o envio de ofício ao Ministério Público da União para que sejam tomadas as providências cabíveis diante das condutas relatadas no processo. (Com informações da Assessoria do TRT-MT)