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Cuiabá, 15 de Janeiro de 2025

Legislativo Quarta-feira, 22 de Março de 2023, 08:38 - A | A

Quarta-feira, 22 de Março de 2023, 08h:38 - A | A

“CARTAS MARCADAS”

Indícios de erro grosseiro em pareceres fazem TJ manter ação contra procuradores

Para o colegiado, trata-se de “distinguishing“ (distinção) e deixou de aplicar no caso os efeitos de uma decisão que absolveu os acusados na seara penal

Lucielly Melo

Indícios de erro grosseiro e má-fé em pareceres jurídicos emitidos pelos procuradores do Estado, Gerson Valerio Pouso e Dorgival Veras de Carvalho, fizeram com que a Primeira Câmara de Direito Público do Tribunal de Justiça de Mato Grosso (TJMT) decidisse pela manutenção da ação que os investiga por atos ímprobos.

Os procuradores são acusados de terem colaborado com o suposto rombo de R$ 418 milhões ao erário, caso que ficou conhecido como “Cartas Marcadas”.

Através de embargos declaratórios, Gerson e Dorgival questionaram julgado anterior, que negou extinguir a ação. Eles apontaram omissão por parte do colegiado, que não teria apreciado a tese de inexistência de dolo, já que a ação penal que apurou os mesmos fatos foi julgada improcedente, sendo cabível o mesmo entendimento no referido caso.

Em acórdãos publicados na segunda-feira (20) constam que o fato de ter decisão desfavorável ao posicionamento dos embargantes não leva ao raciocínio de que houve vício no julgado.

Relatora do caso, a desembargadora Helena Maria Bezerra Ramos, destacou que, ao contrário das teses defensivas, o TJ analisou, sim, a absolvição dada na seara criminal.

Segundo ela, trata-se de “distinguishing“ (distinção), quando a situação dos autos não atende aos requisitos para a adoção de incidência de precedente para que os efeitos da decisão penal surtissem na esfera cível.

“Ressalta-se, ainda, que, o caso dos autos apresenta hipótese de distinguishing em relação ao precedente do STF invocado pelo Embargante (Reclamação n.º 41557/SP - NÚMERO ÚNICO: 0095236-89.2020.1.00.0000), uma vez que o referido julgado trata da mitigação das instâncias quando existente sentença absolutória reconhecendo a inexistência do fato ou negativa de autoria, situação diversa dos presentes autos, em que a rejeição da denúncia criminal teve como base a ausência de provas de dolo na conduta do Agravante em relação à prática do crime de aderir aos planos de quadrilha no que tange à falsificação de créditos públicos, com causa de aumento de pena por se tratar de funcionário público)”.

Ela seguiu esclarecendo que o TJ determinou o trancamento da ação criminal por inexistência de provas acerca do dolo, mas reconheceu que a conduta dos procuradores, diante da “agilidade surpreendente” na emissão de pareceres, poderia configurar possível infração penal.

“Ademais, além de o presente caso não se amoldar na mesma situação fática do julgamento realizado perante a 2ª Câmara de Direito Público deste Tribunal (RAI n. 1007633-33.2021.8.11.0000), em que foi determinado o trancamento da ação por falta de justa causa para a ação penal, em face da atipicidade da conduta, por não ter sido verificada a existência do ato de ofício concreto, praticado com infringência de dever funcional, além da inexistência de nexo entre a conduta imputada e a efetiva atuação do inculpado na prática delitiva narrada na denúncia; não há que se falar em omissão do acórdão em relação ao referido precedente invocado pelo Embargante em sede de memoriais, uma vez que estes se prestam apenas à reforçar os argumentos expendidos nas razões do recurso, não se admitindo trazer argumentos novos, não veiculados quando da respectiva interposição”.

“Por fim, também não há que se falar em omissão quanto à apreciação da tese de inexistência de dolo, porquanto o acórdão embargado expressamente consignou que, não se encontra inequivocamente caracterizada, in casu, qualquer das hipóteses de rejeição da ação que, à época, constavam do art. 17, § 8º, da Lei nº 8.492/92, uma vez que existem indícios concretos de que o Agravante, no exercício de Procurador do Estado de Mato Grosso, emitiu parecer que deu lastro para a emissão das cartas de crédito para pagamento de juros (já quitados) e de honorários advocatícios (não cabíveis), o que teria ocasionado danos ao patrimônio público no valor de R$ 398.981.029,89 (trezentos e noventa e oito mil novecentos e oitenta e um mil e vinte e nove reais e oitenta e nove centavos) e, ainda, o enriquecimento ilícito de terceiros e a violação aos princípios da Administração Pública”, encerrou a magistrada.

A relatora encerrou seu voto, dizendo que “a responsabilização pela emissão de parecer jurídico que deu suporte à ato de improbidade administrativa, quando evidenciada expressa violação da lei (erro grosseiro) ou má-fé, cujas questões somente poderão ser analisadas no curso da lide, após a instrução processual, com observância do devido processo legal e das garantias do contraditório e da ampla defesa”.

Os desembargadores Luiz Carlos da Costa e Maria Aparecida Ribeiro acompanharam a relatora ao votarem pela improcedência dos embargos.

O caso

Além de Gerson Pouso e Dorgival Veras, também respondem ao processo: o ex-deputado estadual, Gilmar Fabris, o procurador Dilmar Portilho, o empresário Jânio Viegas, o ex-servidor da Secretaria de Estado de Fazenda, Enelson Alessandro Nonato, o advogado Ocimar Carneiro de Campos, além de Anglisey Battini Volcov.

Segundo as investigações, o grupo teria causado danos aos cofres públicos, com o esquema fraudulento na emissão de certidões de crédito de cunho salarial, envolvendo órgãos da Administração Pública Estadual e o Sindicato dos Agentes de Administração Fazendária.

Segundo o Ministério Público, a ação resultou na falsificação de papéis de créditos públicos no valor de R$ 665.168.521,99, com violação do Acordo Extrajudicial e à Lei nº 9049/2008 vigente à época dos fatos. O valor desviado da receita pública girou em torno de R$ 418 milhões.

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