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Opinião Terça-feira, 12 de Novembro de 2019, 11:14 - A | A

12 de Novembro de 2019, 11h:14 - A | A

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A relativização que não se sustenta

Hoje, os “tempos estranhos” se clareiam, a constituição renasce vívida, hígida e forte, como nunca deveria ter deixado de ser, pois, com garantias constitucionais, não há qualquer espaço para a relativização



“São tempos estranhos, muito estranhos!” – Esta frase foi dita e redita pelo Min. Marco Aurélio no plenário do c. STF em diferentes oportunidades quando do julgamento de questões envolvendo a famosa prisão após condenação criminal em segunda instância.

A contextualização todos sabem. O c. STF em 2016 alterou o seu (até então) vigente entendimento, de forma a permitir o cumprimento da pena logo após a condenação em segunda instância. Referido entendimento, em mui singela explicação, foi assim firmado porque deveria haver uma compatibilização entre o princípio da presunção de inocência com a efetividade da justiça.

Em outras palavras, relativizou-se a presunção de inocência para satisfazer os anseios da população que, à época, bradava pela condenação judicial a todo custo daqueles que, pela mídia, há muito já se encontravam condenados.

Agora, a situação normalizou-se. O c. STF, em 7.11.2019, reviu seu entendimento. Talvez em razão dos diversos HC’s que não pararam de pipocar em cima da mesa de cada um dos 11 (onze) integrantes da Suprema Corte. Talvez pela intensificação, a cada dia mais aterrorizante de 2016 para cá, dos abusos cometidos por diferentes autoridades. Mas finalmente, talvez porque entendeu-se que uma cara garantia constitucional não se encontra insculpida dentre os direitos fundamentais de um cidadão por mero capricho do constituinte de 1988.

Visualizou-se, talvez, que a relativização de um direito adquirido que, após turbulento período autoritário, foi inserto no sistema legal por uma cláusula pétrea da mais alta Lei, assim como outros tantos, não comporta relativizações, seja para atingir qualquer finalidade, ainda que nobre.

Diz-se nobre porque é de se destacar o trabalho das instituições no combate a um mal que há muito assola o povo brasileiro, a corrupção.

No entanto, como já ressaltado por inúmeras e inúmeros juristas, não se combate esse mal com “outro” mal. É dizer, não se combate a corrupção atropelando o devido processo legal, que, aliás, enrijeceu-se justamente para inibir as mazelas do sistema inquisitório, numa clara valoração das garantias individuais a fim de debelar toda e qualquer condenação infundada por mera deliberação daquele(a) que guarda na voz e na caneta um poder estatal.

De se registrar, por oportuno, que o devido processo legal é um direito do cidadão para proteger-se do Estado absolutista, inquisitorialista e que, por não raras vezes, pratica atos extremados na busca por uma justiça que só existe no mundo dos “justiceiros” e não daqueles que respeitam os princípios constitucionais estabelecidos na Carta Republicana de 1988.

Hoje, os “tempos estranhos” se clareiam, a constituição renasce vívida, hígida e forte, como nunca deveria ter deixado de ser, pois, com garantias constitucionais, não há qualquer espaço para a relativização.

Darlã Martins Vargas é advogado, mestre em Direito Público pela Universidade de Franca-SP, ex-professor de Direito Penal e Direito Administrativo;

Rodrigo Pulino Vargas é advogado, pós-graduando em Direito Processual Civil pela Universidade Mackenzie.