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24 de Julho de 2024

Penal Terça-feira, 18 de Junho de 2024, 08:00 - A | A

18 de Junho de 2024, 08h:00 - A | A

Penal / CONDENAÇÃO ANULADA

Crime de dispensa de licitação exige dolo, decide TJ ao absolver ex-presidente do Indea

Conforme o colegiado, a “mera ausência de observância das formalidades pertinentes à dispensa” somente é passível de sanção quando houve demonstração da vontade ilícita do agente em produzir um resultado danoso

Lucielly Melo



A Terceira Câmara Criminal do Tribunal de Justiça de Mato Grosso (TJMT) decidiu que o crime de dispensa de licitação exige a demonstração de que o acusado teve a intenção de causar lesão ao erário. E por não identificar essa hipótese, o colegiado absolveu o ex-presidente do Instituto de Defesa Agropecuária do Estado de Mato Grosso (Indea), Décio Coutinho, anulando a condenação dele de 8 anos de detenção.

O julgamento ocorreu em abril passado e o processo já transitou em julgado.

Coutinho foi acusado de promover fraudes licitatórias no contrato, sem licitação, celebrado com a LK Editora & Comunicação Ltda, para a elaboração de cartilhas educativas sobre aplicação de vacina contra a febre aftosa, entre os anos de 2004 e 2005.

Segundo a denúncia, Décio Coutinho e Leon Enrique Kalinowski Oliveira, dono da LK Distribuidora, teriam forjado situação que pudesse justificar a inexigibilidade de licitação, causando lesão ao erário, já que as cartilhas também foram adquiridas de forma superfaturada pelo valor de R$ 344 mil.

A defesa do ex-presidente do Indea apelou no TJMT, pedindo a absolvição do acusado diante da ausência do dolo específico. Apontou que Coutinho se amparou em pareceres técnicos, administrativos e jurídicos ao contratar a empresa e que a conduta dele poderia até ser considerada uma “má decisão administrativa”, mas que não houve intenção em lesão ao erário. A tese convenceu o desembargador Gilberto Giraldelli, que relatou o processo.

Ao analisar o caso, o magistrado explicou que a incidência do art. 89 da Lei n.º 8.666/93 depende da presença da comprovação do dolo específico do agente em lesar as finanças públicas, assim como o concreto prejuízo ao erário.

“No entanto, detidamente analisados os autos, estou convencido de que o órgão ministerial não se desincumbiu do seu dever processual de demonstrar, acima de qualquer dúvida razoável, que tenha havido vontade livre e consciente do agente DÉCIO COUTINHO de lesar o erário, predispondo-se em dispensar a licitação com o fim de prejudicar o poder público em benefício próprio ou alheio. Ou seja, não há nenhuma prova de que o denunciado tenha agido dolosamente no sentido de prejudicar o INDEA/MT por meio da manifestação da sua vontade livre e conscientemente dirigida à superação da necessidade de realização da licitação”, entendeu Giraldelli.

O magistrado reconheceu que a dispensa indevida de licitação fora das hipóteses legais constitui ato de improbidade administrativa, mas não necessariamente ilícito penal. E reforçou que a “mera ausência de observância das formalidades pertinentes à dispensa” somente é passível de sanção quando houve demonstração da vontade ilícita do agente em produzir um resultado danoso.

“Aliás, o dano aos cofres públicos decorrente da dispensa de licitação não pode se limitar às arguições ministeriais de que a contratação foi realizada em afronta à lei e que o processo licitatório foi montado para “mascarar” a contratação irregular, simulando o atendimento ao princípio da legalidade”.

Por fim, o relator certificou que os únicos atos comprovados que foram cometidos por Coutinho foram a homologação do resultado dos certames e assinatura do contrato – que não configuraram crimes.

“Diante deste cenário, estou convencido de que não há prova suficiente da autoria atribuída ao apelante, sequer na condição de partícipe, pois, o partícipe deve estar associado ao autor, praticando atos ancilares a fim de proporcionar ao autor os meios para praticar os atos nucleares do tipo, sendo os atos do partícipe sempre subsidiados por sua associação psicológica com o autor e, no presente caso, não há qualquer indício que assinale que a homologação do resultado das licitações ou a assinatura dos respectivos contratos sejam as manifestações materiais de qualquer acordo prévio entre os réus para o cometimento dos crimes imputados”.

O voto do relator foi acompanhado pelos desembargadores Luiz Ferreira da Silva e Rondon Bassil Dower Filho.

O recurso do Ministério Público, que visava a majoração da pena e ainda a condenação de Coutinho ao ressarcimento, restou prejudicado.

CONFIRA ABAIXO O ACÓRDÃO:

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