Lucielly Melo
O ex-deputado estadual, Humberto Melo Bosaipo, foi condenado a 16 anos, cinco meses e 15 dias de prisão pelos crimes de peculato e lavagem de dinheiro, após participar de um esquema fraudulento que desviou mais de R$ 1,6 milhões da Assembleia Legislativa.
A sentença, publicada nesta quarta-feira (15), foi proferida pelo juiz Jean Garcia de Freitas Bezerra, da 7ª Vara Criminal de Cuiabá, que ainda aplicou a sanção de 303 dias-multa.
O caso veio à tona na Operação Arca de Noé, que apurou uma suposta organização criminosa liderada pelo ex-comendador João Arcanjo Ribeiro, com a participação do ex-presidente da AL, José Geraldo Riva, que tinha também o apoio de servidores da Casa de Leis. De acordo com os autos, a quantia milionária foi desviada dos cofres públicos a partir da contratação com a empresa de fachada Edlamar Medeiros Sodre-ME.
Bosaipo chegou a ser condenado pelos fatos, mas a sentença foi anulada pelo Tribunal de Justiça de Mato Grosso (TJMT), em 2019, por suspeição da então juíza Selma Arruma.
Após os autos retornarem à vara, o magistrado concluiu que as provas testemunhais e documentais comprovaram que Bosaipo tramou o esquema.
Na sentença, o juiz rebateu diversas teses defensivas, como a de que a contratação da Edlamar ocorreu de forma legal e que os serviços foram prestados. Ele afirmou que sequer o acusado apresentou notas fiscais, recibos ou documentos que comprovem a prestação dos serviços.
O magistrado citou cegueira deliberada por parte de Bosaipo, já que homologou procedimento licitatório e autorizou pagamentos, sem saber se os bens foram entregues, tirando vantagem da situação.
“Isto posto, não prospera a tese defensiva de que o réu, na condição de Presidente da Assembleia Legislativa, não teria como aferir a legalidade dos processos licitatórios e detectar eventuais fraudes na contração de serviços ou aquisição de bens. Isso porque, na condição de Presidente do Poder Legislativo Estadual, tinha o dever de zelar pela regularidade das aquisições feitas pela Casa de Leis, ainda que mediante de delegação de tal função a pessoa de confiança. Ora, não há como homologar procedimentos licitatórios e avalizar pagamentos sem uma efetiva fiscalização do contrato, mediante comprovação da prestação do serviço ou da entrega de bens. Acrescente-se que o réu sequer apresentou cópia do processo de licitação ou dos documentos pertinentes que subsidiaram a sua autorização para pagamento e assinatura dos cheques correspondentes, a reforçar sua participação no esquema descortinado”.
O magistrado considerou as circunstâncias dos crimes como gravíssimas e que os fatos afetaram a população mato-grossense.
“As consequências do crime lhe são desfavoráveis, porquanto foi subtraída a vultosa quantia de R$ 1.685.822,95 (um milhão, seiscentos e oitenta e cinco mil, oitocentos e vinte e dois reais e noventa e cinco centavos), representando enorme prejuízo ao Estado de Mato Grosso, com elevado número de pessoas carentes e dependentes de auxílio do poder público, sendo certo que o valor desviado e não recuperado certamente contribuiria, ainda que indiretamente, para o atendimento de necessidades básicas dos mato-grossenses, mediante destinação a algum projeto de interesse público. Outrossim, crimes desta natureza promovem o desvirtuamento da Administração Pública nas suas várias camadas, ferindo, dentre outros, os princípios norteadores da legalidade, impessoalidade, moralidade e eficiência”.
“Ademais, a trama foi criada pelo réu enquanto detentor de mandato eletivo de Deputado Estadual, portanto, eleito para representar os interesses do povo mato-grossense, entretanto, deliberadamente, optou por engendrar esquema de desvio de verba pública, visando interesses pessoais em detrimento dos anseios coletivos, de modo que merece valoração negativa”, completou.
Conforme a sentença, a pena deverá ser cumprida no regime fechado.
Entenda o caso
Conforme a denúncia do Ministério Público, o grupo se apropriou de R$ 1.685.822,95 ao simular operações comerciais entre a Assembleia Legislativa e a Edlamar Medeiros Sodre-Me. Segundo as investigações, 32 cheques foram emitidos em favor da empresa, entre julho de 2000 e novembro de 2002.
A empresa de fato existiu, quando foi aberta em 1996, para venda de artigos de vestuário e bijuterias. Só que a firma funcionou apenas um mês. Os contadores Joel Quirino e José Quirino, de forma fraudulenta, abriram a mesma empresa em Várzea Grande, sem o conhecimento da proprietária, e alteraram o objeto social para locação de ônibus, carros, aeronaves, bimotores e venda de passagens aéreas.
Os desvios ocorreram a partir da contratação fraudulenta entre a empresa e a Assembleia Legislativa. Para pagar despesas pesssois e dívidas de campanha eleitoral, Riva e Bosaipo recorriam à Confiança Factoring, de propriedade de João Arcanjo, para obter empréstimos e, em contrapartida, entregavam os cheques emitidos contra a conta corrente da Assembleia.
O esquema contou ainda com a participação de Luiz Eugênio de Godoy, Guilherme da Costa Garcia e Geraldo Lauro.
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