Lucielly Melo
O desembargador Paulo da Cunha, do Tribunal de Justiça de Mato Grosso (TJMT), suspendeu o trâmite da ação penal originária da Operação Arqueiro, após identificar a atuação irregular do Grupo de Atuação Especial contra o Crime Organizado (Gaeco) na instrução processual.
A decisão, proferida nesta sexta-feira (6), atendeu o pedido do advogado Augusto Bouret Orro, que faz a defesa do réu Murilo Cesar Leite Gattas Orro.
Em habeas corpus, o advogado relatou que na audiência realizada no dia 13 de fevereiro passado foi surpreendido com a presença exclusiva do promotor de Justiça Jaime Romaquelli, que integra o Gaeco. Na ocasião, a defesa considerou a situação ilegal, já que ofende o princípio do promotor natural e chegou a reclamar para o Juízo, que indeferiu a solicitação.
Conforme a defesa, nas oitivas seguintes a situação se persistiu, o que levou a protocolar o HC.
No recurso, o advogado sustentou que o Gaeco é um órgão de investigação e que a sua atuação segue até o momento do oferecimento da denúncia. Após o caso tornar ação, cabe o promotor natural seguir com o caso.
Sustentou que “os membros do Gaeco que tem atuado na instrução criminal não são promotores naturais, mas simples “coadjuvantes” da 18ª Procuradoria de Justiça Criminal, o que não lhes confere a prerrogativa de atuarem isoladamente”.
Desta forma, pediu a suspensão do processo e, consequentemente, as audiências que estão marcadas para este mês, até que o mérito seja julgado no TJ.
De início, o desembargador destacou que a questão não é inédita e que o Tribunal de Justiça aplica o entendimento de que os membros do Gaeco só podem atuar na ação penal em conjunto com o promotor de justiça titular.
“Assim, a princípio, há violação à norma do artigo 4º, inciso VII, da Lei Complementar n. 119/2002, que vem se reiterada a cada audiência de instrução e julgamento, inclusive na última realizada em 4/3/2020, como se observa das atas constantes na movimentação eletrônica trazida aos autos (ID 36159496), que indicam apenas a presença nas audiências do Promotor de Justiça Jaime Romaquelli, membro do GAECO”, destacou o desembargador.
Cunha ainda afirmou que a situação reclamada é corriqueira e citou que o colega, desembargador Rondon Bassil Dower Filho, deferiu liminar, recentemente, para também paralisar o processo oriundo da Operação Rêmora por conta do trabalho indevido do Gaeco.
“Assim, diante da indicação de possível ilegalidade processual e de evidente urgência, já que designada audiência para esta data, defiro o pedido de liminar, para sobrestar o curso da ação penal n. 1157-74.2015.811.0042, em trâmite na Sétima Vara Criminal da Comarca da Capital até o julgamento de mérito do writ ou posterior reexame pelo relator natural, a ser sorteado após o fim do plantão judiciário”.
O caso
De acordo com a denúncia, o suposto esquema apurado nas Operações Arqueiro e Ouro de Tolo teria ocorrido entre 2012 e 2014, durante a gestão da ex-primeira dama do Estado, Roseli Barbosa e só veio à tona a partir da divulgação de erros em apostilas que estavam sendo utilizadas nos cursos de capacitação em hotelaria e turismo promovido pela Secretaria de Estado de Trabalho e Assistência Social (Setas).
A Setas teria contratado a empresa Microlins e o Institutos de Desenvolvimento Humano (IDH-MT) para executar programas sociais referentes ao “Qualifica Mato Grosso”, “Copa em Ação”, entre outros através do uso de “laranjas”.
A denúncia apontou como líder da organização criminosa, o dono das empresas Paulo César Lemes, que contava com o apoio da sua esposa, Joeldes Lemes.
Segundo o MPE, a Microlins e o institutos IDH-MT e Concluir receberam do Estado quase R$ 20 milhões para executar programas sociais.
Os crimes imputados são: constituição de organização criminosa, corrupção, peculato, lavagem de dinheiro, uso de documento falso e outros.
Ainda conforme a denúncia, alguns funcionários públicos eram lotados na Setas, dentre eles Jean Estevan Campos Oliveira (à época, secretário adjunto e substituto), a ex-secretária de Estado, Roseli Barbosa, a secretária-adjunta Vanessa Rosin Figueiredo, o assessor especial e ordenador de despesas Rodrigo de Marchi e ainda Rosamaria Ferreira de Carvalho, na época presidente da comissão de cadastramento de entidades na Setas, sendo que todos agiam livre e conscientemente de modo a possibilitar o sucesso das empreitadas criminosas do grupo.
O Ministério Público denunciou ainda a ocorrência de três crimes de corrupção, sendo um deles envolvendo valores oferecidos a Roseli Barbosa ou por ela solicitados ou recebidos da organização criminosa, o segundo referente a valores oferecidos a Rodrigo de Marchi e Vanessa Rosin ou por estes solicitados ou recebidos da organização criminosa e o terceiro relativo a valores oferecidos a Jean Estevan Campos ou por este solicitados ou recebidos da organização criminosa.
O MPE pediu a devolução dos valores subtraídos, condenação por dano moral coletivo, suspensão de pagamentos de contratos firmados entre as empresas e a Setas, além de proibição de celebração de novos contratos, indisponibilidade de bens dos denunciados e afastamento dos sigilos bancário e fiscal.
LEIA ABAIXO A DECISÃO: